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O passado turco e as eleições de 2023: de Atatürk a Erdoğan

Escrito por: Júlia Camargos Magalhães e Sofia Grandini



(Alkis Konstantinidis/Reuters)




Em 29 de outubro de 1923, a República da Turquia foi oficialmente fundada pelas mãos de quem, até os dias atuais, é chamado de “pai dos turcos”. Inspirado pelo positivismo, pelo racionalismo e também pelo iluminismo, Mustafa Kemal Atatürk, símbolo da Turquia moderna, alavancou o movimento nacionalista turco e, em pleno ambiente entre-guerras, moldou e arquitetou um parlamento secular, democrático, guiado pelo progresso científico e educacional. O grande líder não apenas trouxe grandes reformas linguísticas e políticas, como também fortaleceu a imagem de uma Turquia independente, de uma nação de fortes, o que explica a replicação do kemalismo ainda hoje no discurso turco. O orgulho de um passado bem construído, conveniente à queda e à derrota otomana na segunda década do século XX, moldou o que é considerado ideal na política turca, isto é, acaba sendo utilizado constantemente em discursos nacionalistas e, também, em discursos contra as políticas de Erdoğan, considerado pela oposição uma grande antítese de Atatürk.

Recep Tayyip Erdoğan adere uma postura religiosa ao criar o Partido de Justiça e Desenvolvimento (AKP) em 2001, alegando que a Turquia tem que ter uma religião e, não só aceitar, como reafirmar a sua herança muçulmana na sua política, o que resulta em uma grande rede de apoio dos conservadores turcos. Em 2014, Erdoğan faz uma reforma constitucional, tornando o país em um regime presidencialista e se tornando presidente, levando-o a construir uma nova Turquia e a tentar “reconstruir o império otomano” e sua grandeza, com a religião como referência para a sociedade.

As próximas eleições turcas acontecerão em meados de junho de 2023 e Erdoğan já confirmou sua candidatura, porém sua influência e apoio tem diminuído nos últimos anos devido a enorme crise econômica pela qual o país está passando. A lira turca, que em janeiro de 2021 estava 7,3 em relação ao dólar, em dezembro do mesmo ano caiu para 16,69 e, além da crise cambial, a taxa de inflação também está tendo um papel relevante para o enfraquecimento do AKP, pois foi de 21% em novembro para 36% em dezembro de 2021.

Devido a sua queda de popularidade, Erdoğan tinha planos de antecipar as eleições na Turquia para o meio do ano de 2022 para tentar se manter no poder ou para que a porcentagem de votos não caia drasticamente, contudo esse adiantamento não foi aprovado e ela acontecerá conforme o previsto em 2023. Diante de tais discursos de forte oposição a Erdoğan, há uma aparente comparação entre o que um dia foi considerado glorioso, no tempo que se sucedeu o Império Otomano o que, consequentemente, fortalece cada vez mais movimentos nacionalistas e de discursos supremacistas turcos.

O sentimento de pertencer a uma nação turca, esta descendente de um grande imperialismo otomano, transcende o que se limita a bater continência a sua bandeira; o movimento que se estrutura nas bancas política do país, paradoxalmente ao que defendia Atatürk, remete a um extremismo religioso, a um regresso educacional e a uma postura conservadora cultural, que pesca o passado do Império e o indica como ideal. O sentimento político do nascido na Turquia será posto em teste nas eleições em 2023, e o que será posto em xeque é a grande pergunta: por que uma parcela tão significativa vê Erdoğan como símbolo de um país forte?

O retrocesso científico, os movimentos conservadores religiosos, os constantes ataques a imigrantes e a queda do valor da lira turca não são sinal de alerta o suficiente? Ler as linhas do que se espera das eleições de 2023 é uma grande impossibilidade frente ao turbilhão de conflitos geopolíticos que incluem a nação turca. O que se sabe, porém, é como tornou-se turva a visão de um passado de glória, e como o que defendia Atatürk se perdeu no ideal político turco.



REFERÊNCIAS


BAYHAN, Balki Begumhan. A crise econômica da Turquia significa o fim de Erdogan?. Disponível em: https://blogs.lse.ac.uk/europpblog/2022/01/11/does-turkeys-economic-crisis-spell-the-end-for-erdogan/

MOURENZA, Andrés. Apoio ao partido de Erdogan cai ao seu menor nível com a crise na Turquia e acusações de corrupção. El País, 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/internacional/2021-08-17/apoio-ao-partido-de-erdogan-cai-ao-seu-menor-nivel-com-crise-na-turquia-e-acusacoes-de-corrupcao.html.

YILMAZ, Ihsan. The AKP’s Authoritarian, Islamist Populism: Carving out a New Turkey. ECPS EUROPEAN CENTER for POPULISM STUDIES, 2021. Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Ihsan-Yilmaz-3/publication/351119115_2021_Yilmaz_-_The_AKP's_Authoritarian_Islamist_Populism/links/6088be40907dcf667bcacce4/2021-Yilmaz-The-AKPs-Authoritarian-Islamist-Populism.pdf

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